sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Retorno e Triunfo do Sonhar

Olhos fechados, rostinhos serenos. É prazeroso ver como o sono traz feições gentis e uma estranha e quieta ausência de malícia. O aspecto daquelas faces antes ameaçadoras, tramando a derrota alheia, agora ausente, contudo inviolante, inspirando confiança. Até o mais vil dos discípulos de maquiavél pode se tornar um mero desprovido de segundas e terceiras intenções caso esteja dormindo. Quero assistir a todos dormirem, para que seus olhares penetrantes não me cerquem, mas antes desejo vê-los compenetrados num único objetivo: serem puros para com suas essências. Qual despertos são maquinadores de desígnios dominadores, enquanto dormentes são meras faces de meios-sorrisos e nenhuma maldade. Tenho novamente o almejo de sonhar, e ver o quão bom é este plano doce que inspira tanta bondade em carrancas deformadas por ódio e resignação.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Staccato inquietante; Ária de mágoa

Essas pessoas... Para que esquina de seus interiores foram seus sensos? Para qual confim do universo foram suas resoluções? Indigno-me de seus caprichos, tolos! Tolas! São todos animais, por que consideram cuidadosamente seus instintos, se nunca ousam deixá-los? Torna-se para mim cada dia mais difícil empatizar com seus hábitos, com seus humores. Por que me sinto tão desapegado, destacado? São presos por grades de formas, cabelos, sorrisos e prendas. Compensação por aceitação. Indulgência. Cinísmo. Lascívia! Para onde foram seus sensos, danação?! Se me fosse cabida qualquer danação.. Ah, não os culpo.. Não os entendo. São como ovelhas, com ou sem pastor, mas são ovelhas que rastejam como cobras e ladram como cães! Não sigo seus pensamentos, sou tão ilógico assim? Por que não os compreendo? Por que não assimilo seus desígnios e tomo parte de suas vãs futilidades? Tenho como pertence a mim próprio e nada mais; não sinto o pulsar de suas veias, não sinto o calor de suas mãos, só o frio de suas carrancas sem sentido. Sinto-me nu, como quem encontra e perde de imediato, como quem sabe e não lhe é perguntado. Sei, e o pior de tudo é que sei. Sei também o quanto sou maldito nesta lacuna de mundo, sem entender, interiorizar ou almejar qualquer que seja a praxis destes meus primos distantes. Humanos, humanos.. Por que me sinto tão pouco quanto vocês? Por que me enoja tanto sua linguagem? Por que me torno quieto diante de seus olhares brincalhões? Não os entendo, mas amo-os tanto, por que?

domingo, 11 de dezembro de 2011

Alada Sophieé pés de alabastro

"Asas, asas, as guardo para mim!
Só revelo, por sopros, uma espiral sem fim,
repleta de carícias verdejantes de sibilante significado,
que palavras vãs e iníquas jamais teriam falado!"

O charadista continuava por apresentar seu amigo, Jaremy, e com metáforas falava de asas, asas alvas como o leite de tulipas..

"Tu ru ru, tu ru ru, tu ru tu ru ru ru ru ru" serpenteava o flautista, apontando para Cyanjack com a ponta de sua perene flauta transversal.

E pela noite afora, nas areias da praia, sob o céu pululando com estrelas, os dois amigos encantaram dezenas de corações com palavras recitadas com doçura e tristeza; outras sopradas em compassos disformes por lábios em embocadura quente de tanto sibilar. Suspirava, suspirava, suspirava até não poder mais a inebriada Sophieé, dama de três-mais-vinte, que nada sabia da vida. Cambaleava de paixão sem saber quem amava mais, se o ácido misterioso ou o gentil galante, ambos o mesmo inquieto falador, de cartola, camisa vermelha xadrez e sorriso amarelado. Enquanto o flautista distribuia alguns botões de rosa, Cyanjack deu conta de dar ainda mais asas ao coração de pobre Sophieé;

"Dança, canta, craveja o chão com tua graça!
Por que teus preciosos pés o são como um adorno,
peço-lhe teu amor que constantemente me enlaça,
e imploro, doce dama, um último beijo, para meu bom sono.

Questiono eu então, por que hás de me conquistar?
Se em meus sonhos me foi dado o dom do ser sozinho?
Bem sei que amável e de desejo é teu âmbar.
Então declara a mim todo o teu amor e teu carinho!

Asas, asas, as escondi de ti!
Pois meu anjo, sem elas, não podes deixar-me a mim.
Mesquinho, a quero só ao meu lado e por fim,
amaremo-nos eternamente sob estrelas, mesmo aqui!"

E entre rosas rodopiando pelo ar cheio de sereno, nossos amigos conquistadores vagam, triunfantemente, rumo ao próximo povoado onde irão espalhar todo o amor do mundo.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Imaginário de sopros estrelados

O garoto mudo mal se expressava por palavras. Escrevia numa plaquinha de vez em quando, esboçava mímicas. Acima de tudo, soprava notas perenes em sua flauta esverdeada, feita de uma madeira especial das colinas de Angmont. Dizia (ou melhor, diziam por ele), que lhe tinha sido dada por um mágico viajante, o qual nunca mais fora visto. Presente de um místico ou não, o rapaz só a tocava alegremente pelos vilarejos por onde passava juntamente de seu melhor amigo, um charadista de muitas (e confusas) palavras. Tudo era motivo para falar por matemática, adivinhas ou perguntas simples. Nunca falava de maneira comum, indouta. Usava palavras rebuscadas e de tonalidades diferentes. Era quase um pintor da voz, ora gritando carmesins, ora sussurrando verdes-musgo. Ambos eram peculiares, porém muito bem quistos. Trilhavam seus destinos por vagar pelas terras irregulares e pacatas do condado de Inghisbrook e além, espalhando alegria todas as noites, quando faziam do ar livre um espetáculo de notas doces, charadas, risos eufóricos de felicidade e suspiros de garotas, que após o lindo imaginário de flautas e estrelas, como chamavam as apresentações sob o luar, recebiam um botão de rosa de cada um dos dois amigos, Jaremy e Cyanjack.

sábado, 3 de dezembro de 2011

Insólito Imundo Iconoclasta

"Escrever sobre loucura é facil, difícil é ser internado por causa de cavalos"

-So sayeth the wise, Casablanca Maraccino

Sketch nº 7 (Helter Sketcher [No use, babe.])

Us. Nós nunca mudamos. We know, sempre soubemos. Sob diferentes luares pintados em tela viva esboçamos sorrisos verdadeiros e carícias simples. I can almost feel your breath, your smell. Cloves, mint, sun and nuts. Nós sabemos exatamente qual o cheiro. Havia um gesto singelo, nós recordamos, houve um calor genuíno, o peso de nossa cabeça em nosso peito. E o pulsar era gradativo até parar com um desvio de olhar. Oh, smile again, please. As you'd like. We fought, strived, loved. Amamos até a última gota. E por que seus olhos são umbras que refletem estrelas e astros, o mundo foi mudado. Por que és feita de marfim, ébano, ouro e diamantes negros, e por sua forma ser infinitamente bela, o passado se prostra e o futuro suspira. "The curve of your lips will rewrite history". E como se não bastasse a responsabilidade do cativar cabida a todos(we're irresponsible and we know it), a ti pertence a paixão. Dost thou speakest the truth? For we are not us and ours are not thine or mine. We love thee until we can't breath. Nós amamos. Nós sabemos. Nós nos conhecemos. E dê-me a ti, e ti inteiramente, que todas as cores nos serão dadas. For any we, us, thou and ye art, hast or wilt nada aquém daquele mesmo amor, incorrigível.

sábado, 26 de novembro de 2011

O Blues das 16h30

Eu não entendo. Sabe, eu gostava de ir à praia a tarde em dias nublados... Mas ela olhava pro lado, virava de leve a cabeça pro outro, tinha expressão escura.. estava triste, isso era ironicamente claro. Ela não saía daquele banco de ponto de ônibus. Parecia esperar pelo homem certo, aguardando por toda a eternidade. Vez por outra tirava os cabelos castanhos escuros que voavam para sua boca, fazia menção de olhar no relógio. Estava atrasado. Os ônibus passavam, as palmeiras eram balançadas pelo vento, as lágrimas ora escorriam de seu rostinho bronzeado, ora cessavam. Ah, como eu queria poder te escrever versos felizes, baby.. Mas escrevo pra mim. Você merecia a todos eles, os flamencos e bossas, os sambas e baiões que tanto ama, mas a culpa, baby, é daquela moça. É a tristeza que eu preciso pintar nesta carta; dedilhar nestas cordas.. Isso me absolve de fardos insustentáveis, admito sentindo-me fraco. Faço-me forte por escrever; desfaço-me daquilo que me faz fraquejar. Mexia na sua bolsa de vez em quando, como quem procura lá dentro um algoz para suas mágoas e um sorriso singelo. Só tirava solucinhos que escapavam daqueles lábios finos. Não era mais linda que ti, bem sabes.. É só que a fragilidade era tão pesada, tão extenuante.. inspirava o espírito protetor de nós, homens. Porém nunca me apaixonei por ela, confesso, aliviado. Só senti pena. E como único ato de gentileza que me cabia, deixei cair meu lenço perto dela, enquanto atravessava pela calçada.
Eu gostava de ir à praia nestas tardes grises. Não volto mais para lá porque tenho medo dela. E se não posso, baby, te escrever versos mais bonitos então contente-se, por amor e por favor, com meus singelos suspiros por uma estranha que, diferente de mim, nunca encontrou o amor de sua vida passando por essas bandas.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Devaneios de Insolação

O Sol brilha para todos. O céu azul pinta a vida alheia com pinceladas de alegria e boa disposição. O mar salgado é tão doce quando toca aqueles que o amam.. Em que se pese que o Inverno está sempre iminente, raios de Verão são sempre a esperança de uma vida mais quente e menos destratante. O corpo molhado de mulher impresso na areia sempre trará novas de samba às mentes dos crédulos fiéis no mais magnífico templo natural apaixonados por sua luz; Ondas de corrente sul sempre esfriarão os pés quentes daqueles que travam uma constante batalha contra seus próprios almejos. E quando a Lua de Verão trouxer a brisa fresca para acalmar os ânimos dos irmãos insolados, todos que se deitam nas quentes areias da praia poderão assegurar-se de que o mar trará um novo Crepúsculo (já tão conhecido por nós) que sempre, sempre ilustra com maestria a divindade da criação Soft Machine.

sábado, 19 de novembro de 2011

Triste boneco de ferro - Bokanovski's Baseborn Rat

..A natural son of all the lust on the universe. Took as stillborn, thus dead by all means to every soul that dared to live in times so turbulent. Realidade quimera. Curved, starved(Faminto por Motivos) to a semi-counscious state, carved his own cure on that thin chest of his, claiming what was his by rights: A maggot crown bathed crimson in the blood of his days. Heir to a dying throne, a bastard king without lands, power, nor gold. His only riches were the hideouts provided by the moonlight, in which he struggled day after day to find a meaning for that empty phone booth behind the brick wall (Com gritos de guerra pixados). Carrasco. Verdugo. Feitor. He felt the pity only for those who'd inherit the landmine his mind had become. "Culpa de Sangue" - Leia nas paredes, ele dizia. E numa dança circular clamava a vida de inocentes com sua lâmina, gracioso como Cyrano de Bergerac, silencioso como seu próprio nome:

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Blitzkrieg Rendezvous, o Assassino

...Era um homem que lutava contra a sua Smirk, smirk mania de Nudge Wink cacoetes...

...Lazy eye, Grim, Wink...

Agora! Bang! Shake, Wink Smirk!

Sujou.

domingo, 13 de novembro de 2011

O óbvio objetivo, vulgo amar

O homem pode conhecer diversas mulheres, provar de diferentes danças e acariciar infinidades de cabelos diferentes, e ainda assim é marcado pelo tormento cabido ao eterno desesperado tão chamado apaixonado. Não há subjetividade no que se faz explícito e o é por si só, no que é tão lindo que causa agonia, naquilo que consome e germina a glória masculina. Não há como desapropriar do amor o caráter decisivo de sua voracidade, não há como desenhá-lo por linhas, pois enquanto gráfico, sempre será uma folha em branco na mesa do cartunista falido. Não existe confusão no que é tão simples: te quero, te quero e te quero. Não macula o que é inocente em seu arché. Não há mudança no que é por natureza eterno e imutável, não há indecisão no que em sua gênese é resoluto, e que dá ao Andro seu alimento metafísico. Não rotula nem distorce. Não estereotipa. E não importa quantos olhos se admire além do Magnum Opus cabido a cada alquimísta de seu amor, a eterna orbe de estrelas e astros de sua florentina Beatrice sempre será o triunfo do Dante de cada um. Não reflete-se tanto em outros lábios o sorriso que rasga seu ódio. Não leva em conta quantas venha a olhar, contemplar e esquadrinhar; sempre haverá aquela cuja boca tem maior significado, e ainda que se não tenha provado daqueles lábios virgens, sempre saberá de que doce mel foram pintados em seu rosto. Sempre será o vaso de alabastro que salva, dentre um mundo imerso a caos, o Don Juan Derrotado dos braços de sua mágoa desilusória. E não se cansa nunca de dizer que a quer, que a quer e que quer, acima de todas as outras, a Ela.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Imaginário de sopros estrelados

O garoto mudo mal se expressava por palavras. Escrevia numa plaquinha de vez em quando, esboçava mímicas. Acima de tudo, soprava notas perenes em sua flauta esverdeada, feita de uma madeira especial das colinas de Angmont. Dizia (ou melhor, diziam por ele), que lhe tinha sido dada por um mágico viajante, o qual nunca mais fora visto. Presente de um místico ou não, o rapaz só a tocava alegremente pelos vilarejos por onde passava juntamente de seu melhor amigo, um charadista de muitas (e confusas) palavras. Tudo era motivo para falar por matemática, adivinhas ou perguntas simples. Nunca falava de maneira comum, indouta. Usava palavras rebuscadas e de tonalidades diferentes. Era quase um pintor da voz, ora gritando carmesins, ora sussurrando verdes-musgo. Ambos eram peculiares, porém muito bem quistos. Trilhavam seus destinos por vagar pelas terras irregulares e pacatas do condado de Inghisbrook e além, espalhando alegria todas as noites, quando faziam do ar livre um espetáculo de notas doces, charadas, risos eufóricos de felicidade e suspiros de garotas, que após o lindo imaginário de flautas e estrelas, como chamavam as apresentações sob o luar, recebiam um botão de rosa de cada um dos dois amigos, Jaremy e Cyanjack.

domingo, 6 de novembro de 2011

Overture di dolore (Woe to all)

Ondas, surtos incorrigíveis de sangue carregado de paixão ardente, pulsando, pulsando conforme o compasso de sua vida. Todos os dias começam com o abrir dos olhos e a promessa de um alvorecer mais claro, todos os dias começam com o prospecto de uma noite menos escura. Ao passo que crepúsculos, vez por outra, adormecem em abundância de serenidade, em outros casos as fumegantes quanta de dor e euforia descarregam-se sobre o pulsante coração coberto de cicatrizes. Abandonado em seu leito, esperando por dias mais fáceis, perguntava-se se realmente isso tudo valia, se aquilo tudo era apenas fruto de fogos fátuos incitando revoltas em sua existência, ou se aquele carnaval de latejos era real e objetivo; tangível. Euforia seguida de ódio e então dor, mágoa, desespero, todos perdidamente apaixonados pela falta de esperança, maculados pela mão negra que após acariciar seu já entorpecido desejo, o esmagava, causando a aniquilação e o oblívio tão característicos de todas as manhãs ruins. Restava-lhe apenas a fé de que o amanhã traria ondas melhores.

sábado, 5 de novembro de 2011

The kiss of the beast before the last petal fell

The moon used to remind him of those days. Days of old, when the lad played endlessly running about the huge garden of innocence. That vastness of golden leaves often led him into new places, some unknown, some already visited (yet just as well new). Mayhaps his was not so great of an imagination, may be he preferred not to stray too far from the center of that garden, a fountain, surounded by silver chairs. Chairs that cradled him on gentle dreams of clouds as soft as pillows. The Moon. He saw on her an unloved lover, ready to bear all his burdens as no woman did. Ever felt like a misplaced pawn on a much greater-than-life board, always being beaten by a white queen, mean and with deep velvet eyes. Nightmares. Those frightened his boyhood as well as the ones he oft saw on that garden of innocence. Reckoner, mounted, cold-glanced men with toppers gazed at him and pointed to the same mirror that reflected the strange cowled man.
His was the awe, his was the memory of those unfulfilled and unrevealed dellusions of despair. Wishing that, gone a thousand (or so it seemed) years now, he had the moon by his side, he could still only see on his platonic lover the reflection of his past mistakes, under the guise of that same old grinning, cowled man, now much more recognizable: his own present being, sheding tears crimson as a mare's blood. Poor man, rolling the dices to try his future once more. Paying the price of guilt for being such a lackwit. Gaoler of his own desires, overburdened by his own soul's ugliness. Forbidden to feel and forever encumbered by the price of the endless dreaming.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Gott ist lebendig

Chorava lágrimas de alegria cor de safira enquanto recebia em suas mãos a esfera negra estrelada, e a apoiava calmamente sobre seu cólo. Herdara o maior tesouro de toda a existência, e se perguntava se isso era o que Hegel queria dizer com interiorizar a manifestação do espírito. Dane-se Hegel, o que tinha em suas mãos era mais lindo que palavras e pensamentos. A orbe apenas Era. E durante Eras mais ficou ali, parado, apenas contemplando-a, em um confortável torpor, sem perceber o maravilhoso pôr-do-Sol magenta que tomava lugar todos os dias em sua frente. Levantou-se, e foi dar uma volta pela Terra, ver algumas falésias.

domingo, 30 de outubro de 2011

Lakeside Blues

Quando voltou praquela jossa de lugar, nada mais era o mesmo: o que antes chamava de jossa era muito bom e agora era um lixo mesmo. O problema em si não era a cidade, não eram os novos hidrantes, os novos porteiros ou o novo cheiro do lago. O problema nunca seria o quanto a cidade deixou de ser vila e tornou-se habitada por pombos e jovens com carros importados. Não era o pedágio na entrada e nem o novo reverendo, nem a falta de seus pais já mortos há um bom tempo. Tudo o que não conseguia assimilar era aquela linda garota de cabelos negros agora com madeixas louras, um salto imcompreensívelmente fino e bolsas caras. E uma tinta extremamente desnecessária nos olhos. Havia deixado o povoado para trás com pontes de madeira e acordado em um local, após dezenas de corridas contra o Sol, com prédios, grafittis, prostitutas de luxo e uma moça que seria uma total estranha (passando totalmente despercebida e desprovida de fardo emocional saudosista) senão pelos olhos, que tinham o mesmo brilho e aquele constante chamado de "abraçe-me", e pelo sorriso que podia aquecer um lagarto e matá-lo de febre. E ainda que não tivesse feito muito sucesso na infância, após todos estes anos que tornaram-na uma deslumbrante mulher, fazia. Para ele, ela sempre foi o que devia ser: uma linda garota que lutava contra sua timidez e tentava puxar conversa quando as molecagens dele destruíam a situção. Ele a amava, ainda que tão cedo, e tinha certeza que ela também desfrutava deste sentimento.
Algumas miríades de pretendentes, um alto cargo numa empresa de ramo duvidoso e curvas sinuosas na medida certa usurparam a identidade inocente de aspecto quase intelectual, e depuseram-na em favor de uma autoridade egocêntrica, altiva e quiçá dominadora da nova persona. Levaram a sua admiradora secreta e trouxeram-lhe um novo objeto de desejo, ainda que imaculado, tocado pela vã fornicação do ego consumidor. Mataram seu pássaro de Minerva, cujas reais asas lindas e sublimes só podiam ser vistas em sua intimidade, quando revelava-se atravez de suas confissões de garota a mais perfeita das moças, ao menos sob seus olhos perdidamente apaixonados... Transformando-a em mais um manequim de uma loja cara.
Ainda assim, o sino da cidade balançava e chamava os fiéis para seu novo reverendo, que iria encher suas mentes de mentiras, como em sua adolescência. E para celebrar sua volta fracassada decidiu fazer como nos velhos tempos e ainda que sem o amor de sua vida ao seu lado, o agora homem sentou-se à beira do lago, sacou sua gaita, e assoprou em notas estridentes sua melancolia, acompanhada de seu blues favorito e uma garrafa de Seager's.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Sonho nº 6 (Platão em preto e escarlate)

Derivavam um prazer imensurável daquele espancamento. Afogaram-no uma, duas, vinte vezes no rio, gritando impróperios, frases feitas, pedidos de confissão e seu nome em tom jocoso. Seu raciocínio rápido infelizmente não conseguia dizer o por quê, mas sabia que iria melhorar. Não melhorou. Levaram-no até uma cruz de madeira, amarraram-no nela, atearam fogo em seus pés, e enquanto o acusavam de ter apaixonado-se por uma arlequina, riam com dentes podres e pecados aflorando em seus suores. Injustiçado, esmurrado e exalando medo, assistiu em seus ultimos momentos sua carne e sanidade queimando em um fogo cor de azeviche, em nome de um amor do qual nunca provou.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Lorde do Éter

E a fila de dominós continuava a cair. Podia-se ver suas "grandes ideias" quebrarem-se sobre sua cabeça. Pobre Elliot. As vezes a frustração era tanta que sangue escorria do nariz. "É sua pressão, tá comendo muito bacon..." Era só o que o médico dizia. Nem comia carne. As vezes lembrava-se de sua ex-garota, que nunca chegou a ser namorada, e aí se arrependia de ter ao menos pensado. Só que sentia falta de braços femininos, nem que fossem os da sua "mãe" (avó, por que mãe nunca teve). Sua vida parecia uma mesa de cassino. Dominós caindo, casas de cartas indo abaixo, palmadas violentas sobre a própria, seguidas de vociferantes "SEIS!" A vida o trucava constantemente. E metido com uma mão nojenta, copo vazio, falta de vontade e pressão alta, dava um nó four-in-hand em sua gravata 3cm, abotoava seus punhos na camisa, e ia para seu emprego medíocre, sem esperança alguma para um bom jogo. Ao menos pensava que por ser tão diferente, se o matassem e jogassem num destilador de fundo de quintal, poderia gerar grana pra algum traficante, refinando coca. Até ontem de manhã, quando atendeu a campainha meio grogue do pileque de sábado.

domingo, 23 de outubro de 2011

I don't care. (Eu não quero)

O rapaz interessadíssimo perguntava sempre sobre pastéis de carne. "Pastéis de carne estirados no chão são analogia pra cadáver, seu Maraccino?" O rapaz queria saber dos pastéis nos quadros. Eram só pastéis. "É verdade que as queimaduras nas costas só doem a noite por que tem medo do Sol?" Estava ficando pesado demais para sua enxaqueca. Então, calmamente, o artista disse que ia ao banheiro lavar seu rosto, e nunca mais voltou àquele maldito museu de arte moderna. De agora em diante, só pintaria cavalos, que são fáceis de entender.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Calafrio (ou o primeiro soluço que se tem quando volta para a casa do pai)

Que horror.. Que horror!
Pensava que não ia mais, pensava..
Trocou o a pepita de morte pelo tostão mais valioso que há,
Com o penny, comprou pacote de penne,
Só não sabia, não sabia precisar.. quantos pedacinhos estariam bons e quantos ruins.
Ah, e come todo dia. Come da massa que não sabe.
Da que não sente.
Não sentia!
De repente sentiu, de repente voltou;
(Cadê aquela frieza de antes? Não vai manter o cool?)
Frieza em fraqueza, faz questão de frizar.
Friza para si o tempo todo; Arrependido?
Não.. isso passa, há de esvair.

sábado, 15 de outubro de 2011

La vie en Bleu

Engraçado é falar de alegria. Felicidade. Euforia. Ah, refrescante. Engraçado é o Poeta, arrogante, que finge que por escrever descreve o que sente para o mundo se deleitar, quando na verdade se despe de seus sentimentos, passa a não senti-los e de quebra proibe a todos de sentirem, por que se lerem, ah, se lerem vão usurpar, nunca sentir. Usurpador? Talvez. Prefiro proferir e nunca ferir, só afiro, e não difiro, com precisão caminhando por linhas retas, nunca tortas. Idiotisse falar que Poeta escreve em linhas tortas, quem faz isso é destro querendo ser gauche (permitam-se ler ao pé da letra). Poeta pretencioso quer que todo mundo pense igual? Pff, faz-me rir. O Poeta não quer nada além dos braços da amada, quer escreva terror, quer comédia ou romance. Poeta ama, via de regra. E por divagar devagar nas rotas de sonhos, em travesseiro de penas de anjo (o qual amorosamente deu-as para proveito do mortal apaixonado por si mesmo), escreve versos de quintal regados à temível lascívia inerente ao Humano. Treme de rir quando erra seu querido português (atreva-se agora a tomar nota dos erros). E na verdade, o Poeta nem gente é. É um pedacinho de cada um que já sentiu o calor dos braços da melancolia, com suas madeixas tom noir tragante, receptiva, belíssima. O poeta lembra bem de suas noites. Pileques. Viagens. Será isso passado ou presente? Perdeu a noção, pobre rapaz.. Perdeu-a enquanto olhava a moça dançar, como cigana, sem exigir ouro, apenas pedindo atenção às voltas de suas curvas; sem ler mãos, apenas fitando os olhos do pobre Poeta, encantado por querer; não sequestra criançinhas, mas leva o coração dos que a rodeiam, e do rapaz, solene Poeta. O Poeta, no fim das contas, se despe de suas tristezas, malogros e quereres e os troca por uma boa dose de oblívio, por que o dever da noite seguinte o chama, e o Sol raia logo. Ah, Poeta, onde estás? Cigana, tu bem sabes.. E por viver a vida em trajeto ciano, ele quebra as leis entrópicas do sentir e traga seu ultimo suspiro, seguido de escuridão e sono eterno. Poeta desistiu. Desistiu de escrever, desistiu de inspirar, desistiu de despir-se. Poeta se foi, por que descobriu que seu maior amor, sua estimada mente, está caleijada de tanto esquecer, e banha-se agora em paixão descontrolada. Achou sua cigana, por fim, e desistiu dela. Despe-se por fim de seu paletó e chapéu côco, e desbrava seu último poema; silencioso, eterno.

domingo, 9 de outubro de 2011

En Passant

Passarela abarrotada, um, dois, três e muitos mais de passagem. Rápido. Não olham o pássaro, só passam, repassam, apertam o passo. Correndo, não dão atenção, não diferenciam, vivem por viver e correm, morrendo. Pacivos à paisagem, confinados em seus paços paliçados de sonhos cosmopólitas, inaproximáveis, irredutíveis; poucos centimetros de distância, léguas sobre suas têmporas cansadas, palpitantes, não se encontram, não trocam olhares, se reduzem as suas cédulas retangulares, de valor circulante. Gold rush, Gold rush, Gold rush. Pululante com fardados de escritório, maletas quase filactérias, todos com prontidão arrogante para suas discussões no púlpito de valores. A gritaria é tanta que não se vê, quanto mais se ouve, e se houve um dia algo que apaziguasse, caiu na paz do esquecimento. É tudo verbal, sem olhares, e na passarela por onde todo mundo transita, todo o Mundo prantea, sem seus sentidos. Nessa transa incessante de pés, couro, borracha, asfalto e aquele chiclete lazarento, o fel da vida é esquecido em detrimento do cotidiano, que treme em orgasmo por destruir juventudes e amargar amores. É na passarela que anos são perdidos, elos são quebrados, sonhos são construídos em alicerces de incontáveis pedras de carne e osso, e onde, quem se atreve a olhar para o lado, arrisca-se a ser capturado pela peça inimiga ou capturar seu próximo; no fim, não há coragem que sobrepuje a ganância. E ninguém, ninguém se atreve a atravessar pela treva do outro caminho, gramado, diga-se de passagem.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Olhe lá

"Se olhares para o abismo, o abismo o olhará";
A contemplação da divina observância tem, ironicamente,
exorcisado a maior santidade do 'exquadrinhar com o coração'.
Medo de olhar atravessado, medo de expiar o que não se deve, e não poder espiar sua intromissão.
O pavor da máquina deus, maligna, usurpadora, escravizadora e ainda que enfeitiçante, um tanto desencantadora, tira dos olhos o brilho característico de janela e embaça o vidro antes tão polido. E enquanto temo pelos olhares do Elísio e do Abismo igualmente, olho pelo tão promovido Big Brother permissivo, pernicioso e capcioso do observar alheio, e me pergunto então:
"Cadê a tão dita menina dos meus olhos?"

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Ao Zero

"Nem te atrevas onde há trevas."
Não me atrevo.
Aqueles pequenos olhos azuis continuam me olhando debaixo da cama, brotando e espalhando sua prole em todo o canto que produz sombra. Umbrais arautos de pesadelo, pequenos horripilantes olhos azuis assistindo a cada lágrima que cái. O desespero, a fissura, o vício. As agulhas espiando também da borda do criado mudo. Aliás, o silencio só é quebrado pelos distantes risos. Sabia! São aqueles olhinhos. Eles escarnecem de minha ruína, agravam minha enxaqueca, e causam pesadelos. Eles querem que eu perca minha fé. Eles querem que eu conte meu segredo. Eles devoram segredos. Não contarei. Não sucumbirei. A agulha sempre, sempre mentiu para mim. São mentiras de olhos azuis e dentes afiados. Progênie Abissal, descendentes de Belial. Enquanto gargalham debaixo de tudo que é umbral, me desfaço em preces e suor. Desarmado, Desesperado e Desossado, por fim.
São o sussurro do coma. Não aguento mais os tons de ciano, no céu, no teto, no sangue que escorre. Até mesmo quando fecho meus olhos, vejo como um espelho o meu reflexo, e lembro de como são azuis meus olhos.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Antropropaganda

Santos. Diziam-se santos.
Ignóbil convencimento de que uma raça, credo ou nação é superior.
Enquanto Homens, todos lixo.
Parem seus ideais na lama, escravos de seus sucos gástricos; eram antropofágicos.
Pobre orgulho de um povo sem-terra; Sem-Terra.

Hi-Tech Low-life

O julgamento impiedoso, inexorável do réu miserável,
condenado a viver no mais baixo da indústria de sua vida,
produzindo prantos, consumindo inglórias. É sua rotina. Bom dia.
É um bêbado, inebriado de vida, respira, respira para ficar alto, respira sem parar;
E a máquina de deus nega-lhe cada vez mais seu precioso oxigênio,
para dar-lhe apenas a fulígem, cuja massa negra dá apenas conta de escurecer o futuro da raça.
Irônicamente, quer ficar alto, mas vive em auto-rebaixamento.
Financia a igreja de platina e chumbo, e vira carvão.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Santuário de fumaça e espelhos

Essa skyline tênue divide os mortais, no fundo do poço, dos iluminados, nos topos de seus prédios, voando por sua imaginações regadas a soma e bourbon. Debaixo desta placa, só consigo enxergar o que sobrou das luzes ora cintilantes, o certo prenúncio de um futuro trágico. Apesar disso, só penso em não notá-los. Nem seus carros, nem seus cartões de crédito, suas falsas esperanças num deus silencioso de um amanhecer perdido, nem em seus cigarros de sabor; são todos condenados a seus batimentos elevados, fadados a ter apenas a paixão momentãnea que acalma seus ímpetos inebriados de dor e pompa.
No mais sóbrio de meus sonhos, enquanto as luzes ainda eram vigentes em sua supremacia e dotadas de encanto sobrenatural, eu arrotava pedaços de minha existencia e nuvens de impropérios em forma de versos canônicos, dentro de um único formato: a única língua que aprendi a falar, idioma de malditos. Enquanto meu desdém por eles ainda me inspirava apenas o nojo, estava contente. Meu ódio nasceu com a repetição de seus valores e credos pervertidos: diziam me amar, mas só o que valia era a maisvalia. E a saber: não há sonhos, esperanças, e nem heróis aqui no inferno.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Mini-Nota de poucos segundos, a lá Pedro Gabriel

Eu tenho dó de quem ama;
Pena de quem não ama;
E inveja de quem vive.
Eu? Sou só um jardineiro, mas você não diz pelo jeito que ando.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Sonho nº 5 (A cruz e o Onironauta)

Aqui não existe esse negócio de noites em claro. Aqui todas são bem escuras. E os dias também. Aqui não se tem falta de sono, aqui sono é um problema. Aqui o sono tortura, machuca e marca. Aqui não se tem dia, aqui não se tem eu. Aqui os dias não são pares, nem vários, aqui os dias são poucas horas. Horas escuras, horas infindáveis, infindáveis de sono. São pesadelos seguidos, não se consegue mais acordar. Enxaqueca. Vibração. Lateja, pulsa. Dorme, dorme, dorme sem parar, sem sossego, sem descanso, só se corre contra tudo o que vem contra, e tudo vem contra mesmo. Não levanta, não se deita, não se tem, não se há. Reza para acordar, pede para sair. Não sái, não vai, não quer, aqui não se tem querer, só correr do que veio e que volta. Voltou. O suor escorre, maltrata, salga a carne em decomposição, e conserva mais desse sonho ruim, que perdura. É tudo noite. Abre os olhos e olha o Sol, e volta para o escuro, que machuca, mas não queima.